domingo, 23 de março de 2014

[SNES] Art of Fighting

A própria capa tem uma imagem típica de filmes da "sessão kick-boxer"
Art of Fighting tinha sido arrebatador [leia aqui]. Mas eu jogava muito? Não.

Eu era um pivete maravilhado com aquele jogo, mas não tinha grana para ficar jogando em arcade, então eu mais assistia outras pessoas jogarem que jogava. Além disso, uma ficha podia durar apenas alguns instantes. Era uma frustração. Eu queria jogar muito mais do que podia.

Nesse mix de deslumbramento pelo jogo e frustração por não ter como ficar jogando, acabei descobrindo a versão de SNES "perdida" em uma locadora.

Minha cidade tem duas quermesses tradicionais por ano. Hoje em dia elas não tem nenhum atrativo mais. Mecanizaram e burocratizaram tanto, que perdeu seu charme. O pessoal vai por costume, por não ter outras coisas na cidade, mas não imagino uma criança se animando para ir em alguma destas quermesses hoje em dia. Porém, quando eu era pivete, as coisas eram diferentes.

Na época as quermesses tinham várias barracas de jogos, brinquedos e bugigangas, as vezes até com pequenos parques de diversão junto. Uma criança tinha muita coisa para se divertir, e acabava encontrando outras crianças para fazer farra. E esse era um dos raros momentos em que eu conseguia alguns trocadinhos. Minha família era muito pobre, ter um ou dois reais na mão era a realização do ano para mim, e era nessa quermesse que meu pai me dava estes um ou dois reais.

O logo da SNK nem aparece na caixa do jogo.
Numa dessas idas na quermesse, acabei indo em uma locadora que ficava bem próxima. Lembro que naquele momento a locadora estava vazia. A quermesse era bem popular na época. Eu na verdade estava matando tempo indo lá, minha cabeça estava pensando no boteco com Art of Fighting, e que aqueles dois reais dariam quatro fichas. Estava apenas esperando para voltar pra casa e ir jogar. Mas aí meus olhos se depararam com uma imagem que nunca tinha me chamado a atenção antes.

Art of Fighting. A versão de SNES.

Nunca tinha reparado que aquela caixinha estava ali. Nunca tinha me chamado a atenção. Nunca tinha visto ninguém jogar aquele jogo lá. Se não estivesse tão fissurado com o arcade, talvez nunca tivesse dado atenção pra ela. 

Resolvi então jogar ali mesmo. Quatro fichas iriam embora em poucos minutos, mas com o valor de uma ficha eu poderia jogar meia hora na locadora. Salvo as devidas proporções entre as versão, me pareceu uma barganha jogar mais por menos dinheiro.

O próprio dono da locadora estranhou eu pedir aquele jogo. Acho que ninguém nunca tinha jogado ele ali. Ele foi procurar pra ver se a fita realmente "existia". Acabei jogando meus dois reais ali mesmo.

A época em que só os japas se importavam em fazer caixas, manuais e detalhes decentes.
Lógico que o jogo tem muitas diferenças, mas já que não dava pra ficar jogando a versão de Neo Geo, a versão de SNES quebrava o galho.

Depois daquele dia aluguei a fita algumas vezes, e meu objetivo passou a ser conseguir aquela fita para mim. Quem viveu àquela época sabe que você não simplesmente comprava um jogo que você queria, mesmo pirata, principalmente se fosse pobre e morasse numa cidadezinha no fim do mundo. Foi muito trabalho, muitas trocas e muita conversa para conseguir aquele jogo.

Fulano tem o jogo, mas só troca pelo jogo XCiclano tem o jogo X, mas só troca pelo jogo YBeltrano tem o jogo Y, mas não vai com a minha cara, então não troca comigo. Fulano de Tal troca, mas tem que dar um controle também. Etc. Foram meses orquestrando e planejando trocas, procurando as pessoas certas, aguardando o momento certo, e dizendo as coisas certas. Isso sim merecia o nome de "engenharia social".

De posse da tão desejada fita, joguei muito, mas MUITO mesmo. Sozinho, com os amigos, de dia, de noite. Foram várias jogatinas, e uma progressiva descoberta de todos os golpes e especiais do jogo. Não tinha internet nem revistas, tinha que descobrir na raça, e depois ir anotando em algum lugar. Eu costumava fazer um espécie de manualDesenhava a personagem e colocava e lista dos golpes do lado. Bons tempos...

A fita que me fez "destravar" meu SNES.
Depois acabei perdendo meu SNES, e só anos depois quando comprei um novo SNES e comecei a colecionar jogos originais que resolvi comprar o jogo e tê-lo novamente. Não é a mesma coisa que a versão Neo GEO, mas traz algumas boas lembranças, e acabou sendo o primeiro jogo que comprei de SNES.

Curiosamente, para poder jogar este jogo no SNES, tive de destravá-lo. 

Acho que a maioria das pessoas nem sabe que o SNES tinha uma trava de região. Para que os jogos japoneses não rodassem no SNES, colocaram dois "pinos" plásticos do lado do encaixe da fita no console. As fitas americanas têm dois sulcos na parte de trás, próximos às laterais, para não baterem nos "pinos". As fitas japonesas não têm estes sulcos, e, dessa forma, não conseguem ser encaixadas. Nada que um alicate não resolva...

O jogo tem várias diferenças em relação à versão Neo Geo. Claro que o gráfico já era uma perda esperada. Com sprites tão grande s e zoom, além de sprites que mostravam danos nas personagens, alguma coisa teria de ser cortada. Os sprites da versão SNES são menores, e não mostram os danos como os de Neo Geo, os cenários também sofreram algumas perdas, e a própria área de ação do jogo foi reduzida, deixando as barras de life e ki em separado. Alguns comandos foram simplificados, e o jogo nem foi feito pela SNK, ficando a cargo da Takara reprogramá-lo para o SNES. Por outro lado, a versão SNES trouxe a possibilidade de jogar com Mr Big e Takuma, além de acrescentar especiais para todas as personagens, trazer um final mais elaborado, contando a história mais detalhadamente entre AoF1AoF2 e Fatal Fury, e, talvez pela simplificação, acabou tendo uma resposta melhor aos comandos que a versão Neo Geo.

Art of Fighting é um jogo que, para os padrões atuais de jogos de luta, é bem estranho. Não é fluido, tem algumas mecânicas incomuns, mas eu ainda gosto muito do jogo. Fora isso, trouxe vários detalhes e subsistemas que foram incorporados pelos jogos de luta, e hoje são coisas indispensáveis em qualquer jogo novo. Não é um jogo que mereça ser lembrado pela sua jogabilidade, mas certamente foi muito influente, e merecia ser mais lembrado.

4 comentários:

  1. Muito bom dark! Esse aí você pegou lacrado ein? tá novinho.
    Nessa época minha tara na locadora era alugar Fatal Fury Special, pelos mesmos motivos, poder jogar mais por menos. E essa ficha aí era cara ein??? Por aqui na brasólia nos fliperamas a ficha custava R$ 0,25. Em flippers mais tops que chegava a custar R$ 0,50, dependendo do jogo.

    ShinGarou

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    1. Aqui tudo era caro. O único lugar que acho que foi mais barato na época era uma "casa de arcades" mas era bem barra pesada. Os próprios donos ficavam o dia inteiro lá dentro fumando e bebendo, e ia toda sorte de cara estranho. Não era pra criança.

      A fita desse AoF está impecável mesmo, mas o manual veio amassado e caixinha está com as laterais meio danificadas. Acho que o cara que me vendeu tinha mais cuidado com a fita que com o resto. E pra falar a verdade, não sei como não amassou durante a vinda dela. O cara me enviou em um pacote comum, tipo envelope. É um milagre ninguém ter colocado peso em cima no correio...

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  2. Belo post Dark. Essa versão snes de aof1 tb me trás boas lembranças, joguei muito na época e a versão Mega era bem pior, portanto eu ficava frustrado por nao ter um snes e ficava jogando em locadoras. engraçado que eu estava ontem mesmo pensando na magia que era o AOF1, o seu climão de filme de domingo maior, e hj me deparei com seu post.

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    1. Valeu!!

      Eu gosto muito de AoF1. Não tem um sistema fluído, nem um física muito boa, mas tem um clima tão legal, que não consigo deixar de amar este jogo. Muitas horas gastar jogando a versão SNES.

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